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Tribunal condena empresa a pagar 10 vezes o valor de programa da Microsoft

4 de janeiro de 2018

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O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul condenou a empresa BRV MOVEIS LTDA a indenizar Microsoft, Autodesk e Adobe em razão de não ter logrado êxito em provar a aquisição lícita de programas de computador (clique aqui para o inteiro teor do acórdão).

A BRV foi condenada a indenizar em dez vezes o valor de cada programa utilizado sem a devida licença.

Mas o fato interessante do julgado se refere à “inversão” do ônus da prova, quanto à obrigação de se comprovar o uso regular dos programas.

Em primeira instância, a ação foi julgada improcedente, visto que as autoras (Microsoft, Autodesk e Adobe) não fizeram prova da irregularidade.

O Tribunal, então, aplicou o  art. 373, II, do CPC (“Art. 373.  O ônus da prova incumbe: II – ao réu, quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor”), em conjunto com o art. 9º da Lei n. 9.609/98 que prevê que o uso de programa de computador será objeto do contrato de licença, sendo que, na falta deste, o documento fiscal relativo à aquisição ou licenciamento da cópia servirá para comprovação da regularidade do uso.

A decisão, portanto, parece favorecer as empresas de tecnologia, visto que gerou uma “presunção” de irregularidade no uso do software, salvo prova em contrário.

Vale lembrar, entretanto, que o Superior Tribunal de Justiça ampliou a abrangência do artigo 9º da Lei n. 9.609/98 ao decidir que a apresentação da licença de uso ou da nota fiscal não é o único meio de comprovação da autenticidade e regularidade de utilização de software. No caso em questão, a empresa acusada apresentou os discos originais de instalação dos programas apontados como ilegais.

Com relação ao valor fixando a título de indenização, o tribunal gaúcho entendeu que a pena pecuniária imposta ao infrator não se encontra restrita ao valor de mercado dos programas apreendidos. Ou seja, a interpretação do art. 102 da Lei n. 9.610/98 evidencia a intenção do legislador de que seja aplicada indenização para inibir novas práticas semelhantes. O valor fixado segue a jurisprudência de STJ que, desde 2009, estipulou, como parâmetro ao pagamento de indenização, 10 vezes o valor de mercado dos programas.

A Paródia como Fair Usage de Marca: análise do caso Falha de São Paulo vs Folha de São Paulo

27 de setembro de 2017

falha  O Superior Tribunal de Justiça deu ganho de causa ao site Falha de São Paulo, contra a Folha de São Paulo, em disputa sobre o  exercício do direito de paródia versus violação de marcas (clique aqui para ler o inteiro teor do acórdão).

A Folha alegou, em síntese, que, ao registrar nome de domínio com grafia semelhante à de sua marca e utilizar tipo gráfico e diagramação similares aos da marca, além de reproduzir conteúdo do jornal, violou sua propriedade de marca, podendo, ainda, induzir o consumidor em erro.

De outro lado, o titular do domínio falhadesaopaulo.com afirmou que o referido site não tem conotação comercial e que não tem o propósito de retirar os leitores da Folha de São Paulo, mesmo porque estes não encontrariam em sua página informações e notícias que encontram no referido periódico. Sua razão, acrescenta, é tão somente produzir crítica bem humorada de alguma matéria publicada pela Folha. Tal site, assim, poderia ser classificado como um “gripe site”.

Ao proferir o voto vencedor, o ministro Luis Felipe Salomão  entendeu que a paródia é forma de expressão do pensamento, é imitação cômica de composição literária, filme, música, obra qualquer, dotada de comicidade, que se utiliza do deboche e da ironia para entreter. É interpretação nova, adaptação de obra já existente a um novo contexto, com versão diferente, debochada, satírica.

No que respeita a casos emblemáticos dessa forma de expressão, mencionou que, já nos anos 1920, Aparício Fernando de Brinkerhoff Torelly, posteriormente autointitulado Barão de Itararé, mantinha, sob sua autoria, o suplemento satírico denominado A Manha . O próprio nome do periódico, tal qual o caso em questão, parodiava um dos grandes Jornais da época, A Manhã. Na verdade, aqui, trocou-se uma letra – o por a, lá, retirou-se um til. “A Manha começou a circular no dia 13 de maio de 1926 com o subtítulo “Órgão de ataques… de riso”. Propunha-se abertamente a “morder o calcanhar das autoridades”, especialmente a classe política. Com estilo irreverente e inovador, A Manha revelou-se em pouco tempo um sucesso de vendas, colocando-se à frente das publicações concorrentes. A Manha foi o primeiro jornal humorístico a fazer uso de fotomontagens para ridicularizar as autoridades. (http://bndigital.bn.gov.br/artigos/a-manha-2).

Assim, a atividade exercida pela Falha,  paródia , é uma das limitações do direito de autor (fair usage) protegida na lei de direitos autorais (art. 47 da Lei 9.610/1998) , como exercício do  direito de liberdade de expressão, garantido pela Constituição da República.

Por outro lado, (e neste posto, passo a analisar segundo a minha opinião pessoal, visto que o relator do voto vencedor adotou outra linha de argumentação), do ponto de vista do direito marcário, a lei 9279/96, no seu art. 32, estabelece que o titular da marca não poderá impedir a citação da marca em discurso, obra científica ou literária ou qualquer outra publicação, desde que sem conotação comercial e sem prejuízo para seu caráter distintivo.

Neste sentido, podemos entender a palavra “publicação” em sentido lato, englobando, inclusive, URL’s e nomes de domínio. Além disso, não haveria, no presente caso, conotação comercial, visto que a mera menção e links a revistas ou sites de eventuais concorrentes não caracteriza atividade precípua de exploração comercial direta do site. Não se perca de vista, mais uma vez, que a finalidade  do site Falha é de crítica e sátira.

Da mesma forma, entendemos não estar caraterizada a concorrência desleal, visto que não estão sendo vendidos produtos e serviços com aproveitamento parasitário, desvio de clientela ou diluição da marca “Folha”, com a indução dos consumidores em erro. Conforme ressaltara o acordão, não é possível presumir que o público alvo, leitor do jornal Folha, não perceba que a “Falha” é um site de natureza paródica, e, portanto, não patrocinado ou vinculado à “Folha”.

Também do ponto de vista das regras que norteiam os registros de nomes de domínio (CGI.br, resolução n.º 8/2008, art. 1º), entendemos que não  resta caracterizada a violação, visto que não há indução de consumidores em erro, bem como desrespeito à legislação em vigor ou de direitos de terceiros, pois, conforme ressaltamos amiúde, estamos diante de hipótese de uso paródico de marca, protegida pelo direito ao “fair usage”.

DIREITOS AUTORAIS: O QUE É “PEQUENOS TRECHOS”???

17 de junho de 2012

    Recente decisão do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro jogou uma luz sobre o inciso VIII do art. 46 da Lei de Direitos Autorais.

O caso trata da utilização das músicas “Bastidores” e “Gente Humilde” na obra denominada “Alô, Alô, Terezinha!”, documentário sobre o artista Abelardo Barbosa, o Chacrinha, conhecido do público geral por lançar no mercado fonográfico diversos nomes da música popular brasileira e estrangeira, além do famoso programa de calouros.

Com efeito, o referido dispositivo reza o seguinte:

Art. 46 Não constitui ofensa aos direitos autorais: (…)

VIII – a reprodução, em quaisquer obras, de pequenos trechos de obras preexistentes, de qualquer natureza, ou de obra integral, quando de artes plásticas, sempre que a reprodução em si não seja o objetivo principal da obra nova e que não prejudique a exploração normal da obra reproduzida nem cause um prejuízo injustificado aos legítimos interesses dos autores”.

Segundo o aresto, embora não haja menção legal ao que seria “pequeno trecho”, sabe-se que o mesmo caracteriza-se por um fragmento da obra que não contempla sua substância, ou seja, não se refere à extensão da reprodução, mas sim ao conteúdo reproduzido. Isso porque é possível que em 10 ou 15% de reprodução esteja contemplando parte substancial da obra protegida.

Ao final, o julgado menciona precedente do STF, consignado no RE 44754, de 1960:

“NÃO SE CONSIDERA OFENSA AOS DIREITOS DO AUTOR A REPRODUÇÃO DE TRECHO DE OBRA JA PUBLICADA, EM REVISTA DESTINADA A FIM LITERARIO, DIDATICO OU RELIGIOSO, DESDE QUE FEITA A INDICAÇÃO DA ORIGEM E DO NOME DO AUTOR”.

Por conseguinte, segundo o acórdão, não é tão relevante o aspecto quantitativo da reprodução – ponto que muitas vezes doutrinadores e jurisprudência se apegam para definir “pequenos trechos” de obras preexistentes – mas se fora reproduzido parte acidental ou substancial da obra, a caracterizar ou não a necessidade de autorização do titular dos direitos autorais.